Decisões da cúpula da estatal desagradam ao governo Bolsonaro e aliados, que pressionam a estatal para segurar os preços dos combustíveis no ano eleitoral
O Globo – Alvo de pressão do presidente da República e do Congresso, José Mauro Ferreira Coelho renunciou ao comando da Petrobras após 67 dias no cargo, como antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim, em seu blog.
O reajuste de 14,26% no diesel e de 5,18% na gasolina na refinaria, anunciado na última sexta-feira, fez com que as declarações contra o executivo escalassem, com um telefonema do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) ao executivo, ameaças de criação de uma CPI da Petrobras, de investigação sobre gastos e patrimônio da diretoria e de seus parentes e acusações de que era uma liderança “ilegítima”.
Faltando menos de quatro meses para as eleições, a saída de Coelho abre caminho para uma corrida contra o tempo no governo para emplacar o sucessor. E, a partir, daí promover mudanças no Conselho de Administração e na diretoria da empresa. O aumento dos preços dos combustíveis se tornou a principal dor de cabeça da campanha de reeleição de Jair Bolsonaro.
A renúncia de Coelho — que já tinha sido demitido em maio, mas aguardava a aprovação do nome indicado pelo governo — permite uma espécie de “via expressa” para a troca no comando, sem a necessidade de convocar uma assembleia de acionistas, o que poderia significar mais de um mês com a empresa sem um titular.
Hoje, o Comitê de Elegibilidade da Petrobras recebe a documentação para analisar o nome do indicado pelo governo, Caio Paes de Andrade, secretário de Desburocratização do Ministério da Economia. Ele é considerado homem de confiança de Paulo Guedes e tem bom relacionamento com o ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida.
Será feita uma análise de antecedentes de integridade e de currículo e capacitação profissional. Quando o nome de Paes de Andrade foi indicado, especialistas criticaram a falta de experiência dele no setor de óleo e gás, o que estaria em desacordo com a Lei das Estatais.
Os documentos serão analisados por uma equipe de cinco pessoas, das quais apenas quatro votam. O quinto só participa se houver empate. Eles têm prazo de até sete dias para votar, de acordo com as regras da estatal.
Apesar da pressão do governo e de parte dos integrantes do Conselho de Administração da Petrobras ligada ao presidente Jair Bolsonaro, a previsão é que haja um parecer a partir de quinta-feira.
A partir desta recomendação, o Conselho pode eleger Caio como integrante do colegiado e, em seguida, ele pode assumir imediatamente a posição de presidente da estatal.
Ao ser nomeado, Caio já poderia indicar diretores para a empresa, que vão precisar ser posteriormente aprovados pelo Conselho de Administração. O nome do executivo seria ratificado em assembleia de acionistas posteriormente.
Enquanto o processo não avança, o presidente do conselho, Márcio Weber, indicou o diretor de Exploração e Produção, Fernando Borges, para comandar a empresa em caráter interino. Ele está há 38 anos na Petrobras.
Congresso mantém pressão para conter preços
Em outra frente, enquanto o governo articula a troca rápida na empresa, o Congresso discute outras medidas para reduzir o preço dos combustíveis, inclusive ampliando a fatia permitida de gastos fora do teto, a regra fiscal que restringe o avanço de despesas públicas.
As pressões na Petrobras de Bolsonaro e do presidente da Câmara são para que ela mude a política de preços. Desde o governo Michel Temer, a estatal segue a paridade de preços internacional, política que repassa ao valor na refinaria flutuações do barril de petróleo e do dólar. Com a proximidade das eleições, porém, a expectativa é que uma nova diretoria seja instada a segurar preços.
A diretoria da Petrobras vinha argumentando que represar reajustes colocaria o país em risco de sofrer desabastecimento, pois cerca de 30% dos combustíveis são importados. Quando a Petrobras cobra menos do que o valor do mercado, isso funciona como um desestímulo para a importação.
Em um sinal da turbulência, a Petrobras divulgou em poucas horas seis comunicados ao mercado, incluindo os de troca no comando, distribuição de dividendos no valor de R$ 24,2 bilhões e movimentação atípica de ações. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) abriu investigação para apurar o comportamento dos papéis.
CPI: sem clima nem tempo, mas Bolsonaro insiste
Após a saída de Coelho, as ameças de criação de uma CPI começaram a perder força. O vice-presidente, Hamilton Mourão, deu o tom ao afirmar que não há tempo para a articulação de deputados e senadores porque o país está entrando em “fase eleitoral”:
— CPI eu acho que não vai nem andar isso aí, não tem nem tempo.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou, em entrevista à jornalista Andréia Sadi, do g1, não haver clima para uma CPI:
— CPI é para casos muitos excepcionais e fatos constituídos.
Bolsonaro, porém, disse a apoiadores que quer a CPI:
— Investiga o cara, pô. Se não der em nada, tudo bem. Agora, os preços da Petrobras são um abuso.
Lira, no fim da noite, disse que o deputado Altineu Côrtes (RJ), líder do PL, partido do presidente, está recolhendo assinaturas para a instalação de uma CPI.