Estrangeiro tem imunidades que se restringem ao exercício da função e já teve Habeas Corpus negado
O Globo – O cônsul alemão Uwe Herbert Hahn, preso em flagrante no último sábado pela suspeita do assassinato de seu marido belga Walter Henri Maximillen Biot, deverá cumprir a pena no Brasil caso seja condenado pelo crime de homicídio doloso. Biot, de 52 anos, foi encontrado morto na noite da última sexta-feira, dia 5, na cobertura do apartamento onde moravam, em Ipanema. De acordo com a Polícia Civil, a versão de Hahn de que o marido havia tropeçado e caído, não seria compatível com as marcas encontradas no corpo do belga durante a necrópsia.
Gabriel Habib, advogado criminalista e professor da Fundação Getúlio Vargas, que tem em seu currículo passagem pela Defensoria Pública Federal de 2006 a 2019, explica que cônsules têm imunidades restritas ao exercício da função. Diferente de um diplomata que só pode ser julgado em seu país de origem e caso cometa um crime em outra pátria, poderá apenas ser detido, além de não ter um processo criminal aberto.
— A imunidade de um cônsul é de jurisdição penal brasileira. Já o diplomata não se sujeita a mesma, não importa se ele está ou não no exercício da função. Um diplomata só poderá ser julgado no país onde cometeu o crime caso o seu país de origem abra mão de sua imunidade. Já a imunidade do cônsul só abrange atos praticados no exercício da função. Não tem direito a foro privilegiado. Hahn será julgado como uma pessoa normal — detalha.
Hahn será denunciado pelo Ministério Público e julgado pelo Tribunal do Juri, órgão do Poder Judiciário que tem a competência para sentenciar crimes dolosos contra a vida, composto por um juiz presidente e 25 jurados. O alemão poderá cumprir uma sentença de 12 a 30 anos.
— Ele é suspeito de praticar um homicídio qualificado, quando há a intenção de matar por um motivo específico. A motivação será divulgada depois, mas não há benefícios ou imunidade nesse caso — esclarece Habib.
O especialista afirma que qualquer estrangeiro que cometa um crime no Brasil será julgado no país e que são raras as exceções:
— No caso do Hahn, ele teria imunidade se o crime fosse relacionado a sua função de cônsul. Como por exemplo, praticar falsidade ideológica ou sonegação fiscal no exercício da função. Nesta situação, ele não terá nenhum benefício porque o ato criminoso não está ligado às suas atribuições profissionais e isso está previsto na Convenção Internacional de Viena.
A defesa de Hahn, que já teve um Habeas Corpus negado no último domingo, poderia pedir que ele cumpra pena fora do Brasil. No entanto, seria necessário um acordo entre o Brasil e a Alemanha.
— Seria possível caso fosse feito um acordo entre países futuramente. Mas não há nenhuma previsão legal que garanta que ele cumpra a pena na Alemanha — adianta Habib.
O criminalista também afirma que não há enquadramento para violência doméstica, já que este é apenas aplicado em casos contra a mulher.
— Algumas jurisprudências têm sido aplicadas para homens, mas apenas em casos de situação de vulnerabilidade — detalha.
Hahn deverá continuar preso. Caso seja solto, não será pelo fato de ser cônsul.
— Todos os presos em flagrante vão para a audiência de custódia. A defesa pode alegar que não houve flagrante, uma vez que a prisão ocorreu muitas horas após o crime. Apesar de ser suspeito de homicídio, ele pode ser solto. A investigação vai continuar e, caso ele responda o processo em liberdade, o Ministério Público poderá pedir uma nova prisão — esclarece.