Ministro do STF deu nesta segunda-feira três decisões reduzindo facilidades criadas pelo presidente ao acesso de armamento
O Globo – Em três decisões diferentes tomadas nesta segunda-feira, o ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), citou o risco de violência política na eleição deste ano e determinou a suspensão de trechos de decretos do presidente Jair Bolsonaro que facilitaram a compra e porte de armas. “Tenho que o início da campanha eleitoral exaspera o risco de violência política”, escreveu Fachin, que estabeleceu algumas restrições para a aquisição de armas e munições.
O ministro é o relator de três ações — duas delas apresentadas pelo PSB e outra pelo PT — que questionam os decretos de Bolsonaro. O PSB argumentou, por exemplo, que os atos do presidente confrontam dispositivos do Estatuto do Desarmamento, lei aprovada em 2003. No ano passado, a também ministra do STF Rosa Weber já havia dado algumas decisões suspendendo outros trechos de decretos de armas de Bolsonaro.
Essas ações começaram a ser julgadas pelo plenário virtual do STF, em que os ministros votam pelo sistema eletrônico, sem se reunirem, em 2021, mas a análise dos casos está paralisada desde setembro, quando o ministro Nunes Marques pediu vista. Agora, Fachin atendeu a um pedido feito pelo partido em novembro. No caso, a legenda solicitava que fosse dada uma decisão urgente diante do risco apresentado pela demora na análise do tema. O pedido de vista de Nunes Marques completa um ano no dia 17 de setembro.
Agora, Fachin decidiu submeter suas decisões ao referendo do plenário virtual. Agora, porém, se houver pedido de vista, elas permanecerão válidas.
“Conquanto seja recomendável aguardar as contribuições, sempre cuidadosas, decorrentes dos pedidos de vista, passado mais de um ano e à luz dos recentes e lamentáveis episódios de violência política, cumpre conceder a cautelar a fim de resguardar o próprio objeto de deliberação desta Corte. Noutras palavras, o risco de violência política torna de extrema e excepcional urgência a necessidade de se conceder o provimento cautelar”, escreveu o ministro.
Nas três decisões, Fachin defendeu o Estatuto do Desarmamento e destacou o risco de elevação da violência como um todo: “Deve-se indagar se a facilitação à circulação de armas, na sociedade, aumenta ou diminui a expectativa de violência privada. Antecipando a resposta à qual me encaminharei, penso que se deve concluir pelo aumento do risco e consequente violação do dever de proteção pelo Estado.”
Ele também avaliou que, “em contextos de alta violência e sistemática violação de direitos humanos, como é o caso brasileiro”, deve ser considerada “a propensão a otimizar o direito à vida e à segurança, mitigando riscos de aumento da violência”.
Decisões
Entre outros pontos, Fachin derrubou o trecho de um decreto que dispensava a pessoa interessada em adquirir uma arma de fogo de comprovar que realmente precisa dela. A norma estabelece que, no ato da compra, um dos documentos a serem apresentados é a “declaração de efetiva necessidade”. O decreto definia também que deve ser presumida a veracidade dos fatos e circunstâncias informados no documento, trecho que foi suspenso agora por Fachin.
O ministro determinou que “a posse de armas de fogo só pode ser autorizada às pessoas que demonstrem concretamente, por razões profissionais ou pessoais, possuírem efetiva necessidade”.
Fachin também suspendeu uma portaria interministerial, dos ministérios da Defesa e da Justiça, que permite a uma pessoa comprar por mês até 300 unidades de munição esportiva calibre .22 de fogo circular, 200 unidades de munição de caça e esportiva nos calibres 12, 16, 20, 24, 28, 32, 36 e 9.1mm, e 50 unidades das demais munições de calibres permitidos.
A portaria foi editada pelos dois ministérios por determinação de um decreto editado por Bolsonaro em 2019. No lugar, Fachin determinou que a aquisição de munições “se vincula àquilo que, de forma diligente e proporcional, garanta apenas o necessário à segurança dos cidadãos”.
Fachin também determinou que decretos presidenciais não poderão ir além do que já diz o Estatuto do Desarmamento sobre hipóteses de “efetiva necessidade” de arma de fogo. Fixou ainda que “a aquisição de armas de fogo de uso restrito só pode ser autorizada no interesse da própria segurança pública ou da defesa nacional, não em razão do interesse pessoal do requerente”.
Ao GLOBO, Bruno Langeani, do Instituto Sou da Paz, que atua nos processos, comemorou: “Acredito que esta é a decisão mais importante da justiça sobre este tema, pois restabelece a necessidade de análise de efetiva necessidade nos casos de compra e porte, e sinaliza muito claramente que os limites novos de armas e munições (especialmente para CAC) não totalmente desproporcionais.”