Ministro que cuida de processos que podem tornar o ex-presidente inelegível tem agido com rapidez e vai definir na próxima semana encaminhamento dos casos
O Globo – A revelação de uma minuta de decreto para mudar o resultado das eleições de 2022, os atentados terroristas que abalaram Brasília e a postagem golpista de Jair Bolsonaro contra a derrota nas urnas devem “turbinar” no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) as ações que investigam a fracassada campanha à reeleição do ex-presidente da República.
Das 15 ações de investigação judicial eleitoral (conhecidas como “aijes”) que miram Bolsonaro, há pelo menos três que dialogam, em maior ou menor grau, com os fatos políticos desta semana.
São elas: a ação sobre a infame reunião com embaixadores, repleta de ataques infundados ao sistema eletrônico de votação; outra que trata do funcionamento de um ecossistema bolsonarista de desinformação; e uma terceira ação que apura o sequestro político da parada militar de 7 de Setembro, que se tornou comício eleitoreiro, ao invés de comemoração do Bicentenário da Independência.
Conforme revelou a coluna, uma das lideranças de protestos golpistas contra o resultado das eleições acionou o Ministério da Defesa para colocar tratores em plena parada militar em Brasília – e conseguiu.
Há também o inquérito administrativo instaurado para investigar os sucessivos ataques do ex-ocupante do Palácio do Planalto à Justiça Eleitoral. Nesse inquérito, o então ministro da Justiça, Anderson Torres, já prestou depoimento ao TSE em agosto de 2021, quando admitiu não ter prova de fraude nas eleições.
Conforme informou a colunista Bela Megale, o PL avalia que a minuta golpista encontrada na casa de Torres será usada para tornar Bolsonaro inelegível. Dentro do TSE, a avaliação é semelhante, já que os novos fatos poderiam servir para confirmar as acusações de abuso de poder político, econômico e uso indevido dos meios de comunicação.
“A coisa ficou péssima. Vai ser um inferno”, resume um aliado de Bolsonaro. Um ministro do TSE concorda que a situação ficou “complicadíssima”.
Tanto o inquérito administrativo quanto as 15 ações que pedem a declaração de inelegibilidade de Bolsonaro podem afastá-lo de disputar qualquer eleição pelos próximos oito anos. Esses processos estão nas mãos do corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Benedito Gonçalves, que se tornou peça-chave do tabuleiro político nacional.
Gonçalves é uma espécie de fiel aliado do presidente do TSE, Alexandre de Moraes, se aliando ao ministro nos principais casos julgados pela Corte, como a aplicação da multa de R$ 22,9 milhões ao PL, partido de Bolsonaro, por pedir a anulação de parte dos votos das eleições sem comprovar fraudes.
Em um julgamento duramente criticado por bolsonaristas, Gonçalves e Moraes formaram maioria para manter no ar vídeos em que Lula chamava o então chefe do Executivo de “genocida” por conta da gestão catastrófica da pandemia.
Segundo fontes que acompanham os casos contra Bolsonaro, há uma série de caminhos jurídicos possíveis para que os novos fatos políticos cheguem a esses processos relativos à campanha eleitoral de 2022, como uma decisão do próprio Gonçalves ou de Alexandre de Moraes, relator de inquéritos que atormentam o clã Bolsonaro no Supremo. Moraes já compartilhou em outros casos provas do STF com o TSE.
Os ministros também podem determinar a medida a partir de eventuais pedidos formulados pelo Ministério Público ou até mesmo por adversários políticos de Bolsonaro, que movem as ações contra o ex-presidente no TSE.
Segundo a equipe da coluna apurou, Gonçalves pretende se reunir na próxima semana com a sua equipe da Corregedoria do TSE para mapear o andamento das ações contra Bolsonaro – e dos processos movidos contra Lula, também alvo de investigações no tribunal.
O ministro tem levado para análise dos colegas no plenário do TSE pequenas questões processuais que poderiam levar à anulação das ações mais à frente. O objetivo é reduzir o espaço de manobra de Bolsonaro, permitindo que as ações sejam julgadas futuramente sem risco de serem implodidas.
Em dezembro do ano passado, por exemplo, o TSE rejeitou uma questão apresentada pela defesa de Bolsonaro, que alegava que a Corte era incompetente para julgar a ação da reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada. Para a defesa do PL, o evento não tinha caráter eleitoral e, portanto, não deveria ser investigado no âmbito do TSE. O argumento foi rechaçado por todos os ministros.
A interlocutores, Gonçalves tem sinalizado que esse tipo de ação demanda um bom tempo de instrução (a fase de coleta de provas), com a realização de depoimentos, análise de documentos e a adoção de eventuais medidas drásticas, como quebras de sigilo.
As ações contra a chapa Dilma/Temer, por exemplo, foram julgadas dois anos e meio após o fim das eleições de 2014, vencidas pela petista.
A ação mais espinhosa contra a eleição de Bolsonaro em 2018, sobre o disparo de mensagens em massa pelo WhatsApp, só foi apreciada pelo plenário do TSE três anos depois do pleito.
Mesmo assim, o PL teme um julgamento sumário do ex-presidente da República, e o corregedor tem trabalho com rapidez, dando andamento acelerado aos casos e tirando o sono de bolsonaristas.