Vice-presidente e ministro de Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, diz que há ‘overbooking de empresários’ na viagem; governo brasileiro quer mudar perfil do comércio com os chineses, hoje baseado na exportação de commodities
Estadão | O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prepara uma megacomitiva para acompanhá-lo na visita de Estado à China, no fim deste mês. A lista tem cerca de 200 empresários, de 140 setores da economia, toda a cúpula do Congresso Nacional e ao menos cinco ministros de Estado. A viagem de Lula à China, de 26 a 30 de março, se tornou a mais disputada entre empresários nos últimos anos. Eles deflagraram uma corrida por espaço na comitiva oficial.
A China é desde 2009 o principal parceiro comercial do Brasil, com superávit a favor do País de US$ 61,8 bilhões em 2022. Mas há interesse brasileiro em mudar o perfil, baseado na exportação de commodities e importação de manufaturados, com objetivo de gerar mais empregos para brasileiros. Diplomatas dizem que uma lista de acordos em diferentes áreas de cooperação está em discussão para ser firmada, entre elas uma iniciativa ambiental.
Os chineses têm acenado com novos investimentos na indústria automobilística nacional, com a expectativa de aquisição da antiga fábrica da Ford em Camaçari (BA) pela BYD. Há interesse em ampliar as exportações de carne ao país, por isso a presença na comitiva de grandes frigoríficos, com objetivo de ter novas plantas habilitadas. A Embraer reforçou a ofensiva para vender a linhas aéreas chinesas seu mais moderno avião comercial, um jato de médio porte 190 E2.
A dimensão “chinesa” da comitiva expõe o interesse comercial e político China. Lula será o primeiro líder político latino-americano recebido por Xi Jinping, recém reeleito pelo parlamento chinês para um terceiro mandato inédito. O petista também será recebido pelo primeiro-ministro Li Qiang. Do ponto de vista geopolítico, Lula quer discutir com Xi Jinping o fim da guerra na Ucrânia.
O vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou ao Estadão que Lula perguntou a ele quais eram os setores mais relevantes para a viagem à China. “Eu disse: ‘Olha, é difícil saber qual área não é relevante’ “, respondeu. Do agronegócio à mineração, passando por aeronáutica, indústria, serviços e tecnologia, são muitos os setores que querem acompanhar a comitiva ao país asiático. “É um overbooking de empresários”, comparou Alckmin.
O Estadão apurou que a comitiva empresarial contará com aproximadamente 140 grupos econômicos. Na lista estão infraestrutura, bancos, agronegócio, proteína animal, setor de alimentos, roupas e calçados, além de inovação digital. Entre as empresas que irão à China a JBS, Marfrig, Vale, Embraer, Suzano e os bancos Bradesco e Marka marcarão presença.
“Vai se retomar com muita força essa relação Brasil-China, coisa que no governo Bolsonaro foi tratada com negligência. O embaixador chinês passou mais tempo aqui tendo problemas com piadas de mau gosto, aquilo foi danoso a nossa economia”, disse Jorge Viana ao Estadão. “Como a China pode ter 2,6 trilhões de dólares de investimento externo no mundo e só R$ 30 bilhões no Brasil. Agora vai ficar quanto? Vai ser R$ 100 bilhões? Não sei. Mas com certeza o presidente vai fazer esse reloginho girar. Vamos criar o ambiente para ter conversas de negócios, um encontro empresarial.”
Os empresários têm buscado três interlocutores no governo para participar da missão empresarial. Lideram a montagem da comitiva – e a distribuição de vagas -, o vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin, pela Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços; o ministro Alexandre Padilha, pela Secretaria de Relações Institucionais/Conselho de Desenvolvimento, Econômico e Social; e Jorge Viana, presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos – Apex Brasil.
São eles que recebem os pedidos e filtram a lista. Alckmin montava uma lista mais enxuta com cerca de 20 grandes nomes do empresariado brasileiro. Mas houve muitos pedidos de empresários com interesse na China, de menor faturamento.
A Apex chegou a abrir um formulário on-line para manifestação de interesses em participar de um encontro de Lula com empresários chineses e brasileiros, em Pequim. A ideia é que levantem demandas e entraves ao avanço do comércio e de investimentos e possam dialogar entre si e diretamente com Lula. Parcerias podem ser concluídas e anunciadas, embora o evento não tenha um formato de rodada de negócios.
Na prática, eles vão pagando as próprias despesas, mas podem ser escalados pelo governo para falar em apresentações e ter assento nas reuniões e seminário empresarial preparado pela Apex Brasil com empresários chineses. O foco são os chefes das empresas estatais chinesas que podem fazer investimentos no Brasil.
Além dos órgãos governamentais, a preparação passa por interlocutores de entidades privadas, como o Lide China, o Conselho Empresarial Brasil-China e o Ibrachina. Os três devem enviar representantes. O advogado Thomas Law, interlocutor do último grupo, diz que cada empresário vai custear as próprias despesas e que vão promover mais atividades paralelas à agenda presidencial, com visitas a outras cidades.