Presidente da Casa nega ‘rixa’ com presidente do Senado, mas reitera que a tramitação sobre o rito das MPs não deve sofrer interferência da Corte
O Globo – Em meio a uma disputa política sobre o rito das Medidas Provisórias (MPs), o presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) foi questionado se a Câmara dos Deputados pode descumprir uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), caso a Corte interfira na decisão das Casas legislativas.
— Pode. Politicamente pode. A decisão dos líderes, por unanimidade, é que são contra comissões no formato que estão e são contra abrir mão da prerrogativa como Casa iniciadora — disse Arthur Lira em entrevista ao Valor Econômico. .
Em seguida, o presidente da Câmara afirmou ser contra a interferência da Suprema Corte.
— Com todo respeito ao Poder Judiciário, sou contra a judicialização da política. Vão dizer: o rito é constitucional. É. O que estamos discutindo é que temos que mudar a Constituição porque as Casas não se entendem. Não será uma decisão judicial que fará com que os líderes indiquem [os integrantes da comissão], que a Mesa paute, que o plenário vote.
Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), não entram em um consenso sobre o formato de tramitação das MPs — normas com força de lei editadas pelo presidente da República — que vigorava até o início da pandemia de Covid-19. Até então, as medidas começavam a ser analisadas numa comissão mista, formada por igual número de deputados e senadores. A relatoria de cada MP se alternava entre representantes das duas Casas. O posto é estratégico, pois cabe ao relator elaborar um parecer sobre aquela matéria.
O Supremo foi incluído na discussão na última semana, quando o ministro do STF Nunes Marques determinou que Lira preste informações sobre o rito dos MPs. A decisão atende a um pedido do senador Alessandro Vieira (PSDB-SE).
Na avaliação de Lira, os deputados não concordam com a volta das comissões no modelo que existia antes e que podem boicota-las, mesmo se houver decisão judicial. Para o presidente da Câmara, uma solução seria mudar a composição.
— Seria alternativa, mas a Câmara está hoje contra a comissão mista. Por tudo o que houve no passado, os escândalos, malfeitos e negociações. Uma MP chegava na comissão com dois artigos e saia com 30.
Em seguida, o presidente da Câmara afirmou que a Casa pode se recusar a indicar integrantes mesmo após decisão judicial e relembrou o passado das comissões, o que gera resistência por parte da Casa.
— Seria alternativa, mas a Câmara está hoje contra a comissão mista. Por tudo o que houve no passado, os escândalos, malfeitos e negociações. Uma MP chegava na comissão com dois artigos e saia com 30 — afirmou.
De acordo com Lira, caso as MPs caducarem, a culpa será do Senado. Questionado sobre a dificuldade de diálogo, o presidente da Câmara disse que não há rixa entre eles.
— Rixa não há. O que houve é que o presidente do Senado deixou de conversar. Ponto. Eu não briguei com ninguém. Não é o presidente da Câmara que tem espaço no governo e precisa dar satisfação. Se há alguém que tem espaço no governo é o Senado, que não pode atrapalhar a vida do governo e nem do país.
Em entrevista ao GLOBO, Pacheco disse que caso não haja um acordo com Lira, o Congresso vai retomar as comissões mistas para analisar medidas provisórias.
– Não havendo um entendimento de mudança constitucional, prevalece a ordem constitucional atual, que é a necessidade de submeter as medidas provisórias às comissões mistas – afirmou o presidente do Senado.
O senador, no entanto, afirmou que há a expectativa de um entendimento até o final desta semana.
Entenda a disputa
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e o da Câmara, Arthur Lira, protagonizam nos bastidores uma disputa em torno das regras de tramitação das Medidas Provisórias no Congresso.
A situação começou a preocupar o presidente Lula, já que pode atrasar o andamento das MPs estratégicas de seu governo. Após editadas, as propostas entram em vigor, mas precisam ser votadas nas Casas Legislativas em até 120 dias para que o texto não perca o efeito.
Entre as normas que aguardam na fila estão uma que reorganiza os ministérios, criando e extinguindo pastas, e outra que dá ao governo o voto de minerva nos julgamentos do tribunal administrativo da Receita Federal (Carf). A extinção da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), assunto que vem gerando reação entre congressistas, também foi levada adiante via MP.