Vazamento de nomes indicados para o BC criou clima de desconfiança
Folha de São Paulo – Na tentativa de desfazer o mal-estar e o clima de embate entre a Fazenda e a Casa Civil, os ministros Fernando Haddad e Rui Costa tiveram nesta quinta-feira (23) um encontro para aparar arestas e apaziguar a relação entre os dois após uma série de atritos.
A reunião, que inicialmente não constava na agenda, durou cerca de 40 minutos e ocorreu na sede da Fazenda. Ao fim, os dois ministros desceram para falar com a imprensa e posaram para fotos, juntos e sorridentes.
“Atrito? Aqui, ó, o sorriso dele, olha o meu”, disse Rui Costa em tom amigável, ladeado por um ministro da Fazenda também sorridente.
O objetivo central do encontro era selar a paz e dissipar o clima de desconfiança que se abateu no núcleo do governo, inflamado por uma série de vazamentos que desagradaram a Haddad e vinham sendo colocados na conta do chefe da Casa Civil.
Os dois tiveram uma conversa franca para desfazer ruídos recentes envolvendo a divulgação dos nomes dos dois futuros indicados à diretoria do Banco Central e de detalhes da nova regra fiscal a ser proposta pelo Ministério da Fazenda.
O encontro foi uma iniciativa de Rui Costa, que já havia ligado para Haddad na noite de quarta-feira (22) para dizer que não tinha relação com a divulgação dos nomes.
A suspeita se deu porque, na terça-feira (21), Costa disse em entrevista à GloboNews que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já tinha definido os nomes para o BC a partir das sugestões de Haddad e que o encaminhamento formal seria feito após a viagem do presidente à China, que começa no dia 25 de março e vai até 1º de abril.
“O Haddad levou os dois nomes, ele [Lula] conversou com os dois, aprovou e vai indicar os dois nomes ao Senado assim que retornar [da China]”, disse o ministro.
Horas depois, os nomes vazaram à imprensa, antes mesmo da indicação oficial e de Haddad conseguir conversar com o presidente do BC, Roberto Campos Neto, sobre as escolhas.
O vazamento incomodou o ministro da Fazenda, que creditou a divulgação a Costa —justamente por ele ter dito antes que já havia definição em torno do tema. Haddad não quis confirmar a escolha quando questionado por jornalistas na noite de quarta-feira (22).
Segundo aliados, Haddad ficou contrariado por ter se reunido na mesma noite com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sem que tivesse mencionado a sucessão no BC, já que não tinha sido formalizado.
Um dos nomes, o do administrador Rodolfo Fróes, passou a ser bombardeado por críticas por acumular no currículo a direção de uma empresa do grupo J&F (dos irmãos Batista) e uma sociedade com o trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, acionistas de referência da Americanas, hoje em recuperação judicial.
A exposição precoce dos escolhidos do governo para o BC fez com que Haddad começasse a reconsiderar os nomes, e uma mudança nas indicações não está totalmente descartada. O próprio ministro disse que encaminhou a Lula cinco possíveis candidatos para que o presidente pudesse escolher os novos diretores. A expectativa é que o assunto seja debatido entre os dois durante a viagem à China.
Na “DR” entre Haddad e Costa, os dois tentaram desfazer o que agora já começam a chamar de mal-entendidos.
Haddad, por sua vez, cobrou o fato de o colega ter dito publicamente que a escolha já estava fechada sem que de fato estivesse. Os dois discutiram formas de tentar evitar novos vazamentos, atribuídos por aliados de Haddad à Casa Civil.
Os ministros também aproveitaram para esclarecer o episódio da reunião da JEO (Junta de Execução Orçamentária), realizada na última terça-feira para definir as novas projeções fiscais para o Orçamento do ano.
O chefe da Casa Civil perguntou a Haddad se ele o tinha “jogado na fogueira”. Ele se referia ao fato de circular a informação de que Costa tinha submetido os colegas de Esplanada a uma espera de mais de 50 minutos.
O encontro estava previsto para as 8h30, mas acabou atrasando quase 50 minutos. Haddad, que tinha compromissos na sequência, foi embora e deixou o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, como seu representante.
Mais tarde, ao ser questionado sobre sua ausência, o ministro da Fazenda citou o atraso —que acabou sendo interpretado como uma indicação de que Rui Costa fez os ministros esperarem.
O mal-estar em relação a essa declaração foi externado pelo chefe da Casa Civil. Haddad alegou ter se justificado em resposta à versão de que teria feito uma desfeita a Costa.
Eles ainda colocaram em pratos limpos a informação que chegou aos ouvidos de Haddad de que Costa teria sido ríspido com a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, em uma reunião —o que o ministro negou que tenha ocorrido.
Ao fim do encontro, Haddad disse que acompanharia o colega até a saída do ministério, onde eram aguardados por jornalistas.
Em rápida entrevista, Costa disse que o teor do encontro foi “o trabalho em conjunto para o governo Lula dar certo”. “Estamos trabalhando firme e vamos nessa parceria com certeza garantir emprego, renda e que o Brasil melhore”, disse.
Em tom descontraído, Haddad afirmou que a visita partiu de uma reclamação dele, de que ainda não havia recebido a visita de Costa. “Agora eu fui visitado, como todos os outros ministros”, disse.
“Conversamos sobre tudo, temos muita coisa para falar, para alinhar. Falamos sobre Copom [Comitê de Política Monetária], falamos sobre Congresso, falamos sobre solução da tramitação das medidas provisórias. É uma agenda longa, mas o projeto vai vingar. Isso que é importante”, acrescentou Haddad.
Antes de entrar no carro, Costa ainda se voltou aos jornalistas e afirmou que eles “ganharam uma foto hoje”.