Governo publicou determinações a plataformas com o objetivo de evitar conteúdos de violência contra escolas; leia opiniões de advogados
Poder360 — O Ministério da Justiça e Segurança Pública publicou uma portaria na quarta-feira (12) com o intuito de prevenir a disseminação de postagens relacionas a ataques a escolas nas redes sociais. A medida estabelece sanções às plataformas que não seguirem as determinações do Executivo, que podem levar, inclusive, à retirada da rede do ar.
Há trechos no documento (leia aqui) que ficaram abertos e passíveis de interpretações diversas. Como exemplo, o artigo que determina a remoção de publicações com “conteúdos idênticos ou similares àqueles cuja exclusão tenha sido determinada”, sem especificar os critérios que serão considerados para classificar a similaridade entre postagens.
Apesar de integrantes do ministério evitarem dizer em público, incluindo o chefe da pasta, Flávio Dino, o principal alvo da notificação é o Twitter. A rede já recebeu uma série de pedidos de remoção de contas pela pasta. Entretanto, as regras da portaria valem para todas as redes sociais. Dentre as determinações previstas, está a necessidade de as plataformas apresentarem quais medidas já estão tomando, proativamente, para evitar o compartilhamento de conteúdos que possam ser considerados ilícitos.
O documento é publicado em meio a discussões sobre o Marco Civil da Internet e sobre regulação das redes sociais entre diferentes órgãos. Além do Ministério da Justiça, a Advocacia Geral da União (AGU) e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm tratado sobre o tema ao lado de debates sobre o direito à liberdade de expressão.
“Nós não temos nenhuma dúvida que, juridicamente, a portaria é plenamente compatível com as leis e não há qualquer violação ao Marco Civil da Internet. Esse é um falso debate”, declarou Dino.
Para o cientista político e professor de direito eleitoral Alexandre Basílio, um ponto positivo da portaria é determinar a criação de um banco de dados de ilícitos. A medida pode exigir que as mídias excluam conteúdos idênticos aos levantados. “Contudo, não se pode desconsiderar que a portaria menciona conteúdo semelhante, o que pode causar exclusões arbitrárias“, ponderou.
Basílio também entende que a portaria pode ser analisada por 2 vieses. “O 1º é quanto à responsabilização das plataformas quanto à má-prestação dos serviços que oferece“, afirma. Para o advogado, isso ocorre quando a plataforma não se empenha em tornar indisponível uma publicação depois de ser notificada sobre um possível crime; ou quando o conteúdo viola os termos de uso da própria plataforma.
Mas, por outro lado, o especialista entende que a portaria exige “questões perigosas” das plataformas, como determinar que as redes impeçam a criação de perfis a partir de um parâmetro de número utilizado pelo usuário.
“Esses números são dinâmicos. O número que você utiliza neste momento, pode ser utilizado por mim amanhã. Então, tecnicamente falando, não é uma solução. Melhor seria se considerasse o número telefônico, a multiplicidade de contas, o e-mail do usuário e, até mesmo, tais informações associadas”, considera.
“Não posso deixar de considerar que existem mecanismos já oferecidos pelas plataformas que poderiam ter sido ampliados“, completa o professor. Como exemplo, cita uma ferramenta do Facebook utilizada para a comunicação entre a rede e órgãos da Justiça.
A advogada Karina Kufa, especialista em direito eleitoral, entende que a melhor forma de preservar a liberdade de expressão em casos que não são criminosos “e podem ser assim enquadrados pelo governo por interesses políticos” seja adotar investigações da Polícia Federal.
“O governo tem por obrigação equipar adequadamente as polícias para a investigação criminal cibernética, inclusive reforçando os postos que tratam do tema. A ação rápida da polícia pode impedir a ocorrência de crimes. Sua análise rápida da situação de risco, combinado com a possibilidade de identificação dos usuários e localização, pode permitir a atuação eficiente“, considera.
Já sobre a suspensão de usuários e sanções às plataformas, a advogada entende que a medida compete ao Poder Judiciário, “que é isento de paixões políticas“. Ela sugere, por exemplo, um convênio entre a Justiça e o Ministério Público para uma atuação conjunta no combate ao crime nas redes sociais.
“Dar esse poder ao executivo, ainda mais num momento que existe forte polaridade política, é um risco muito grande à sociedade por poder afetar outros setores, como, por exemplo, calar parlamentares de suas opiniões“, afirma Kufa.
O advogado, professor e doutor em direito pela USP (Universidade de São Paulo) Renato Ribeiro de Almeida concorda com a publicação da portaria “na medida em que as plataformas pertencem a empresas privadas, e a publicação de uma pessoa, nessas plataformas, é sim de responsabilidade destas empresas, especialmente no que tange a crimes envolvendo crianças e menores de idade”.
Ribeiro considera “imprescindível” que as redes sociais criem serviços próprios em casos de identificação de atividades consideradas ilícitas, para que haja o devido monitoramento dessas publicações. “Por isso eu entendo que as sanções, enquanto poder normativo do governo federal, são adequadas, e podem gerar sim o banimento dessas redes no território nacional caso não estejam observando regras mínimas de segurança para os seus cidadãos“, diz o advogado.