Folha de São Paulo | O presidente do Uruguai Luis Alberto Lacalle Pou se disse surpreso nesta terça (30) com a fala do líder brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de que havia “narrativas” sobre a situação política da Venezuela.
“Esta reunião foi antecipada, não sei se de forma planejada, por uma bilateral entre Brasil e Venezuela. E há uma declaração que está sendo negociada neste momento, que tenho o rascunho aqui. Fiquei surpreso quando foi dito que o que acontece na Venezuela é uma narrativa. Já sabem o que pensamos sobre a Venezuela e o governo da Venezuela”, afirmou ele durante o encontro organizado por Lula em Brasília.
Lacalle Pou ainda disse que o pior a ser feito é “tapar o sol com a mão”. “Se há tantos grupos no mundo tentando mediar para que a democracia seja plena na Venezuela, para que os direitos humanos sejam respeitados, para que não haja presos políticos, o pior que podemos fazer é tapar o sol com a mão”.
Lula realiza nesta terça uma reunião de líderes da sul-americanos na tentativa de criar maior integração na região. No dia anterior, o presidente recebeu o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, em visita oficial. Na ocasião, disse que as acusações de falta de democracia no país caribenho eram parte de uma “narrativa”.
“Cabe à Venezuela mostrar a sua narrativa para que possa efetivamente fazer as pessoas mudarem de opinião. É preciso que você [Maduro] construa a sua narrativa. E a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que o que eles têm contado contra você. Está nas suas mãos construir a sua narrativa e virar esse jogo, para que a gente possa vencer definitivamente, e a Venezuela, voltar a ser um país soberano, onde somente seu povo, por meio de votação livre, diga quem é que vai governar esse país”, afirmou Lula.
Não é a primeira vez que Lacalle Pou destoa de outros líderes da região, principalmente os que são mais alinhados à esquerda. O presidente uruguaio já criticou o Brasil e a Argentina devido às declarações de líderes de ambos os países contrárias à ideia de acordos de livre comércio que Montevidéu negocia com China e Nova Zelândia. O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, por exemplo, afirmou em entrevista à Folha que tirar uma ideia como essa do papel significaria a destruição do Mercosul.
O centro-direitista também disse que “não é necessário ser de esquerda para defender a democracia”, contrariando falas do presidente da Argentina, Alberto Fernández, e de Lula, em Buenos Aires. O contexto era a cúpula da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos), em janeiro, que incluía a participação do líder da ditadura cubana, Miguel Díaz-Canel. Na ocasião, Lacalle Pou afirmou que nem todos ali respeitavam os valores democráticos e que era perigoso fazer da Celac um clube ideológico.
“Ouvi discursos com os quais concordo totalmente, outros com os quais concordo com a metade e outros com os quais não concordo em quase nada. Mas entendo que nossas nações precisam se vincular”, disse o líder uruguaio naquela oportunidade. “A declaração da Celac fala de respeito à democracia, aos direitos humanos e do cuidado às instituições, mas claramente existem países aqui que não respeitam nem as instituições nem a democracia nem os direitos humanos.”