A realidade se impôs ao morador do Palácio da Alvorada que há uma semana disse ter acordado vendo notícias que anunciavam o “fim do mundo” com a ameaça de seu governo perder ministérios recém-criados. “Tudo normal”, amenizou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta quarta-feira, 31, o petista foi obrigado a baixar uma ordem unida para salvar anéis e dedos de sua gestão.
Por meio de seus líderes e de um gabinete responsável pela articulação política, Lula foi informado que havia uma fatura a ser paga pelo preço de aprovar a Medida Provisória que instituiu a estrutura ministerial do novo governo. A conta tinha como credora a Câmara dos Deputados com seu presidente Arthur Lira (PP-AL) apresentando-se como atravessador de pleitos e vontades parlamentares.
Nos últimos dias, Lira e os seus ensinaram que a Câmara de 2023 não é afeita à docilidade que Lula encontrou nos seus dois primeiros mandatos. Os deputados souberam até manobrar com o calendário para colocar o Poder Executivo de joelhos.
Sem tempo para negociar ou mesmo dizer não a um ou outro pedido — a MP caduca à meia-noite do dia 1º de junho — o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, foi cedo falar com Lira. Ele ainda pôs o chefe-presidente ao telefone para também falar com Lira.
A conversa ocorreu com um presidente da Câmara às turras com seu conterrâneo e senador Renan Calheiros, que tem um filho ministro do governo. Lira já avisou que não está gostando do tratamento que recebe do aliado alagoano deLula. Mais tarde ainda disse que havia uma insatisfação generalizada com a instância batizada de “articulação política do governo”, personalizada, na verdade, na figura do ministro Padilha.
Na negociação em que só restou ao Planalto ceder, já que amarga as agruras da fragilidade de sua base parlamentar, penando para amealhar votos necessários a aprovar um projeto de lei. Fala-se de liberação de recursos de emendas ao orçamento da União e cargos na administração federal. São essas as moedas que circulam no tradicional mercado político brasiliense.
Assim, o dono do cofre cede ao dono das leis para manter uma aparente harmonia entre os Poderes em Brasília. Na falta de um presidencialismo de coalisão estável, vai-se seguindo à base de uma Parlamento que parece se impor pela debilidade dos aliados que o atual governo conseguiu reunir até o momento.
Encerrado o pregão político da Câmara, Lula agora é devedor na outra casa, o Senado Federal, que tem 24 horas para aprovar a MP dos Ministérios. Ali, o campo aparentemente não é tão belicoso. Não à toa, o petista fez movimentos para ter o presidente daquela Casa Rodrigo Pacheco (PSD-MG) mais próximo de si. Jogado o jogo da política, como o próprio Lula referiu, espera ele não ser acordado no dia 2 de junho ao som dos versos de Eduardo Dussek cantarolando: “me serve o café que o mundo acabou”.
Por: Estadão