Debatedores convidados e senadores divergiram em sessão temática sobre a efetividade do passaporte sanitário — proveniente da vacinação — a ser adotado como medida de enfrentamento à pandemia de covid-19. Enquanto alguns participantes defenderam a iniciativa como um estímulo a ampla imunização da população contra a doença, outros questionaram se a exigência do passaporte não estaria infringindo a liberdade individual e chegaram a negar a efetividade das vacinas.
Na avaliação do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), autor do requerimento para realização da sessão, é preciso “buscar o bom senso” sobre a questão, mantendo o “delicado equilíbrio” entre os interesses coletivos e os individuais, sem ferir o direito à liberdade, garantido pela Constituição.
— Como manter o delicado equilíbrio entre o interesse coletivo e os interesses individuais? Como preservar a proporcionalidade entre o poder do Estado e a frágil vida privada familiar e cotidiana? Como proteger, ao mesmo tempo, a sociedade em geral e cada indivíduo em particular, evitando interferências indevidas e injustificadas sobre as escolhas de cada cidadão?
Já o senador Carlos Portinho (PL-RJ), autor do PL 1.674/2021, aprovado pelo Senado, que cria o certificado de vacinação e checagem, explicou que o texto foi concebido, naquele momento, como um antídoto para que setores da economia pudessem retomar suas atividades. Ele defendeu o texto, mesmo que passe por ajustes, para que ele esteja adaptado à nova realidade do Brasil.
— Não vamos poder abandonar o certificado de vacinação e testagem quando o mundo inteiro o pede, o exige. Sim, nós vamos precisar do certificado de vacinação e testagem provavelmente para eventos em que haja grande aglomeração. Não estou falando do colégio; estou falando de 10 mil, 15 mil pessoas, 30 mil pessoas, enquanto perdurar. Agora, a vacinação é obrigatória. Ela nunca foi compulsória no nosso país. Cabe ao governo conscientizar a população da sua necessidade — acrescentou Portinho.
O senador Marcos Rogério (DEM-RO) disse que a pandemia trouxe muitas dúvidas, principalmente em relação à legislação trabalhista. Para ele, não há unanimidade na ciência em relação à doença e aos imunizantes. Na sua visão, a liberdade individual não pode ser relativizada com a adoção do passaporte sanitário.
— Eu me vacinei, mas eu defendo de forma intransigente o direito das pessoas de, se quiserem, não se vacinarem. É direito delas! Eu me vacinei. Agora, eu não tenho o direito de colocar a faca no pescoço de ninguém para determinar que faça ou deixe de fazer. É escolha do cidadão. Quem é que pode dar todas as garantias inerentes a essa ou àquela escolha ao paciente, ao cidadão? — declarou Marcos Rogério.
Convidada pelo requerimento de Girão, a deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) disse que a discussão sobre a adoção do passaporte sanitário é “de natureza jurídica” já que não há legislação vigente que possa penalizar quem não se vacinar. Para ela, os gestores municipais e estaduais estão submetendo trabalhadores à “cassação de direitos trabalhistas” e estudantes a “constrangimentos ilegais”.
— As pessoas estão sendo demitidas com ‘justa causa’, e qualquer iniciante no estudo do direito trabalhista sabe que as situações que permitem a justa causa são taxativas, têm que estar previstas de maneira clara e objetiva na legislação. Não é uma portaria, não é uma resolução, não é uma decisão, ainda que do Supremo Tribunal Federal, que vai estabelecer uma justa causa — disse Janaína Paschoal.
Já o procurador do Ministério Público do Trabalho Luciano Lima Leivas afirmou que há um conjunto de princípios e legislações relacionadas a normas de segurança dos trabalhadores que podem ser aplicadas nessa situação. Ele observou que a cobertura vacinal se reveste como medida de saúde coletiva, de controle de um risco biológico em determinado ambiente, cujo empregador tem responsabilidade pela saúde da coletividade. Ele ainda explicou que, nesse caso, serão observadas todas as particularidades que motivaram a não vacinação do empregado, como as comorbidades pelas quais caberia o enquadramento em justa causa.
— Ainda que o trabalhador tenha uma recusa injustificada (…), ainda assim, a orientação do Ministério Público do Trabalho é a de que esse trabalhador, dentro das possibilidades da organização empresarial, seja colocado em trabalho remoto e não seja feita a dispensa por justa causa — declarou, observando que, não havendo condições de realizar trabalho por via remota, o empregador poderia dispensar o trabalhador, aí sim por justa causa.