Texto propõe retirar o programa Bolsa Família do teto de gastos de forma permanente
Folha Invest | A Bolsa de Valores brasileira abriu em forte queda nesta quinta-feira (17), retomando o movimento de baixa da véspera, e o dólar continuava a avançar contra real. A movimentação é uma resposta à proposta do novo governo de furar o teto de gastos para pagar Bolsa Família e às declarações do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a reação dos mercados.
Indicador de referência da Bolsa, o Ibovespa caía 2,06% às 10h15, recuando aos 107.969 pontos. O dólar comercial à vista subia 1,70%, cotado a R$ 5,4760 na venda. Mais cedo, na abertura do mercado de câmbio, a moeda americana havia disparado mais de 2%, com a cotação atingindo R$ 5,53.
Em fala durante encontro com ONGs nesta quinta, Lula defendeu furar o teto de gastos como uma “responsabilidade social”, para conseguir financiar programas sociais. Na COP27, conferência do clima da ONU que ocorre em Sharm el-Sheikh, no Egito, ele participou de uma reunião com a sociedade civil brasileira.
“Se eu falar isso vai cair a Bolsa, vai aumentar o dólar? Paciência”, disse Lula, completando que a flutuação dos índices não acontece “por causa das pessoas sérias, mas por conta dos especuladores que ficam especulando todo santo dia”.
Na quarta-feira (16), o índice Ibovespa tombou 2,58%, aos 110.243 pontos, depois de ter mergulhado mais de 3% ao longo do dia. O dólar comercial à vista avançou 1,52%, valendo R$ 5,3840 na venda. O mercado de juros futuros também apresentou forte alta. A taxa DI (depósitos interbancários) para 2024 passou dos 14% ao ano.
O mercado financeiro doméstico foi pressionado ao longo do dia por rumores sobre o nome do futuro ministro da Fazenda e pela espera por uma definição quanto às despesas que ficarão fora do teto de gastos em 2023.
À noite, após o fechamento do mercado, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), apresentou a minuta da PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, que propõe retirar o programa Bolsa Família do teto de forma permanente e abre caminho para honrar promessas de campanha do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A medida é considerada necessária para evitar um apagão social no ano que vem, já que a proposta de Orçamento enviada em agosto pelo governo Jair Bolsonaro (PL) assegura apenas um valor médio de R$ 405,21 para os beneficiários, além de impor cortes severos nas verbas para a habitação e no Farmácia Popular.
Analistas explicam que, ao abrir mais brechas para ampliar gastos sem uma limitação como a imposta pelo teto de gastos, o governo gera condições para que a inflação ganhe fôlego devido ao aumento de dinheiro público circulando no mercado.
Para controlar essa pressão inflacionária, o Banco Central pode retomar as elevações da taxa de juros do país, hoje em 13,75% ao ano. Juros altos tendem a esfriar o mercado de ações, pois investidores se voltam para os ganhos oferecidos pela renda fixa. Isso reduz a capacidade das empresas financiarem seus projetos, prejudicando a geração de emprego.
Além disso, o descontrole dos gastos públicos pode dificultar a execução do plano financeiro traçado pelo governo. É o chamado risco fiscal. Investir no país fica mais arriscado e investidores levam seus dólares para fora, tornando a moeda americana mais cara por aqui. Esse processo gera inflação e requer juros ainda mais altos.
Em momentos de incertezas sobre os rumos da economia, investidores também avaliam que retorno dos títulos do governo precisa ser mais altos para compensar o risco, o que exerce ainda mais pressão no mercado de juros.
“Os juros sobem com a ideia de que o Brasil pode ter um problema fiscal devido à intenção do governo de aumentar os gastos”, comentou Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos. “Já que o país quer gastar mais, o investidor cobra um prêmio maior.”