Para ícone da esquerda mundial, ex-presidente se destaca por sugerir negociação em vez de escalar conflito
Folha de São Paulo – O linguista americano Noam Chomsky, 93, ícone da esquerda mundial, surpreendeu em uma entrevista ao citar o ex-presidente dos EUA Donald Trump como única figura política do Ocidente a defender uma saída diplomática para a Guerra da Ucrânia, em vez de escalar o conflito.
No vídeo publicado no canal EduKitchen do YouTube na última quarta-feira (27), Chomsky fala sobre diferentes assuntos, entre eles o conflito no país europeu. Foi após uma pergunta sobre os gastos americanos para ajudar Kiev que o linguista falou do republicano.
“Há, felizmente, um estadista nos EUA e na Europa, uma alta figura pública, que fez uma declaração muito sensível sobre como solucionar a crise, facilitando negociações em vez de miná-las”, afirmou o americano. “Seu nome é Donald J. Trump.”
Para o linguista, o ex-presidente é o único estadista ocidental que sugeriu uma solução parecida com a proposta de George H. W. Bush no início dos anos 1990, após o colapso da União Soviética. Quando a Alemanha foi reunificada naquela época, diplomatas ocidentais prometeram aos russos que a Otan (aliança militar ocidental) não iria se expandir a Leste além do novo país no centro da Europa. Os russos cobram até hoje aquele compromisso, que nunca foi colocado no papel.
Apesar de ressaltar que Trump não mencionou esse exemplo especificamente, Chomsky disse ser similar ao que foi chamado de Parceria para Paz. “Não eliminaria a Otan, mas cumpriria a promessa de que a Otan não expandiria para o Leste.”
“Ele não mencionou tudo isso, mas sugeriu algo parecido: avançar para negociações e diplomacia em vez de escalar a guerra”, continuou o americano, que destacou que Trump não é sua pessoa favorita. “Acho que é a pessoa mais perigosa talvez da história, mas vamos falar a verdade. Ele é a única pessoa que falou e é o jeito correto para sair [da crise]. Outros falaram também, mas não em posições tão importantes.”
Chomsky não especificou quando ou o que exatamente o ex-presidente falou. Em comunicado no último dia 18, o republicano disse não fazer “sentido que Rússia e Ucrânia não estejam se sentando e trabalhando em algum tipo de acordo”. “Essa guerra nunca deveria ter acontecido, mas aconteceu. A solução nunca será tão boa quanto teria sido antes de os tiros começarem, mas há uma solução, e deveria ser arranjada agora —não depois— quando todo mundo estará MORTO!”
Antes da invasão russa à Ucrânia, houve diversos encontros diplomáticos, realizados com o objetivo de amenizar as tensões. Apenas em fevereiro, por exemplo, o presidente russo, Vladimir Putin, recebeu o mandatário francês, Emmanuel Macron, o primeiro-ministro alemão, Olaf Scholz, e falou ao telefone com o líder americano, Joe Biden.
Com o conflito iniciado, os países ocidentais não entraram no campo de batalha, mas têm enviado armamentos para os ucranianos, além de aplicarem duras sanções contra a Rússia. Os EUA também se movimentam para fornecer um auxílio bilionário.
Biden pediu na última quinta (28) US$ 33 bilhões (cerca de R$ 166,6 bilhões) ao Congresso americano em ajuda à Ucrânia, que inclui mais de US$ 20 bilhões (R$ 100,7 bilhões) para armas, munições e outros tipos de assistência militar e US$ 8,5 bilhões (R$ 42,8 bilhões) em ajuda econômica direta ao governo em Kiev, além de US$ 3 bilhões (R$ 15,1 bilhões) para auxílio humanitário e alimentar.
Os US$ 20 bilhões reservados por Biden para o flanco militar representam cinco vezes o orçamento ucraniano de 2021 para a área da Defesa, incluindo aí gastos com pensões e salários de militares.
Os russos vêm reagindo à cada vez mais intensa ajuda americana no conflito. Na última segunda (25), por meio de uma nota e de uma entrevista de seu embaixador em Washington, Moscou criticou o envio de armamentos. “O que os americanos estão fazendo é jogar gasolina no fogo”, disse o diplomata Anatoli Antonov. “Enfatizamos que é inaceitável que os EUA despejem armas na Ucrânia.”