Projeto prorroga por mais dois anos subsídios às fontes incentivadas, como energia eólica e solar. Texto precisa ser votado pelos senadores até o fim deste mês
Aprovada no fim de agosto na Câmara dos Deputados, uma medida provisória (MP) pode gerar um custo de até R$ 4,5 bilhões por ano por até 30 anos na conta de luz dos brasileiros. Agora, a MP segue para discussão no Senado.
O cálculo está presente em um documento elaborado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Para entrar em vigor, o texto precisa ser votado pelos senadores até o fim deste mês. De acordo com parlamentares, existe a possibilidade de votar essa e outras MPs em sessão antes das eleições.
“A proposta trará impactos nas tarifas de todos os consumidores de energia elétrica do país e, em particular, aos consumidores das regiões Norte e Nordeste, que já possuem as maiores tarifas médias do país”, afirma a agência.
A maior parte do impacto virá da prorrogação de subsídios às fontes incentivadas (como energia eólica e solar). Esses subsídios foram criados para incentivar a expansão da matriz energética renovável do Brasil, quando os equipamentos eram caros, a tecnologia nova e havia pouco investimento no setor. Hoje, a energia eólica já representa 12,3% da capacidade de geração instalada no país, e a solar, 3%.
Agora, há dias em que o Nordeste inteiro, por exemplo, é abastecido com energia eólica. Além disso, essas fontes já estão baratas e presentes no portfólio de praticamente todas as principais empresas de distribuição e comercialização de energia do país. Por isso, especialistas e o próprio governo avaliam que esses subsídios não se justificam mais para novos empreendimentos. Normalmente, os subsídios são voltados ao incentivo de novas fontes, que precisam de algum benefício para incentivar a sua viabilidade econômica.
— As fontes renováveis não precisam de qualquer subsídio para entregar energia limpa ao consumidor. Essas fontes já são competitivas — afirma Luiz Augusto Barroso, presidente da PSR, consultoria especializada em energia.
Uma lei aprovada recentemente estabeleceu um limite para a concessão dos subsídios às fontes incentivadas. Somente outorgas solicitadas até março de 2022, e que entrassem em operação comercial em até quatro anos teriam direito aos subsídios.
A medida provisória aprovada na Câmara vai em sentido contrário, ampliando em mais dois anos para novos empreendimentos conseguirem o subsídio. “Mais dois anos de subsídio significarão, pelo menos, um adicional de R$ 4,5 bilhões, por ano, que ficarão nas tarifas por 30 anos, dado esse ser o período das outorgas beneficiadas pelas alterações”, afirma a Aneel.
Os subsídios do setor elétrico são reunidos na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). Hoje, 95% do fundo é custeado por todos os consumidores de energia por meio das contas de luz. Sozinho, isso foi responsável por uma alta média de 4,65% nas tarifas de energia das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste neste ano, na comparação com 2021.
Entre 2017 e 2022, os subsídios do setor elétrico dobraram de valor, passando de R$ 15,99 bilhões para R$ 32,1 bilhões. No mesmo período, os subsídios às fontes incentivadas praticamente quadruplicaram, passando de R$ 2,15 bilhões para R$ 7,93 bilhões.
A agência afirma que já há uma grande quantidade de geração renovável contratada para os próximos anos. Já existem em outorgas aprovadas 81 gigawatts (GW) de energia solar, eólica e pequenas centrais hidrelétricas, que ainda não entraram em operação comercial, e outros 160 GW de pedidos de outorga em análise, distribuídos em milhares de projetos, um sinal de que existe interesse do setor privado pelas fontes.
“As outorgas aprovadas e as em análise representam, respectivamente, 43% e 86% da potência instalada atual do país, o que significa que a oferta com direito a desconto será suficiente para atender o crescimento da demanda do país por décadas e, portanto, a única restrição ao crescimento dos subsídios seria o limite temporal”, afirma a Aneel.
Tarifas de transmissão
Em 2022, houve um aporte extraordinário de R$ 5 bilhões na CDE em razão da privatização da Eletrobras. Porém, em 2023, o valor cai para R$ 530 milhões, o que também significa, na prática, ampliação do valor de CDE a ser pago pelos consumidores.
“A proposta de prorrogação (de subsídios) amplia o cenário de elevação dos custos da CDE e não há sinalização de recursos (aportes) para a CDE, o que inevitavelmente resultará em aumento tarifário”, afirma a Aneel.
A medida provisória também impõe a estabilização das tarifas de uso do sistema de transmissão a serem pagas pelos geradores, uma espécie de “congelamento” dessas tarifas por todo o período de outorga, ou seja, 30 anos, que teria correção apenas pelo índice inflacionário. Para a Aneel, a consequência direta é que o custo da expansão do sistema de transmissão recairá sobre os consumidores.
Por último, a MP interrompe uma mudança no cálculo das tarifas de transmissão que beneficiaria especificamente consumidores do Norte e Nordeste. Essa interrupção impedirá a redução das tarifas dos consumidores do Nordeste em 2,4% e do Norte em 0,8%.