Depois de meses de confinamento e uma série de protestos populares, o governo chinês passou a flexibilizar suas medidas de contingência aos casos de Covid-19.
G1 – Após meses de confinamento da população em diversas cidades da China, o governo do país começou a flexibilizar – mesmo que pouco – a política de tolerância zero contra a Covid-19. As mudanças chegam em um momento de tensão na região, com uma série de manifestações contra o confinamento.
Estabelecimentos reabriram e as exigências para a circulação de pessoas pelas cidades estão mais brandas, o que mexe diretamente com o funcionamento da economia local. Mas os impactos da política de Covid zero vão além das fronteiras chinesas e se espalham por todo o mundo – inclusive o Brasil.
Desde os primeiros sinais de que o governo chinês liberaria a circulação, os mercados financeiros globais reagiram positivamente, conforme aumentam as expectativas de que a economia da China vai voltar a crescer de forma mais robusta.
As restrições afetam a oferta
Simone Pasianotto, economista chefe da Reag Investimentos, explica que as restrições de circulação na China afetam diversos pontos importantes da economia.
O primeiro é sob a ótica da oferta. Com o bloqueio de diversas cidades – inclusive algumas muito importantes, como Pequim, a capital do país, e Xangai, o coração financeiro da região –, a produção de diversos produtos foi comprometida.
A Apple, por exemplo, anunciou no começo de novembro o atraso na produção de milhares de aparelhos celulares das linhas iPhone 14 e iPhone 14 Pro. Uma das principais fábricas da gigante da tecnologia fica em Zhengzhou que, após uma nova alta no número de casos de Covid voltou a ficar em confinamento.
Com problemas na oferta dos mais variados produtos, que são distribuídos ao redor de todo o mundo, os preços começam a subir. É um dos principais ingredientes para a inflação, comenta Simone.
Essa pressão inflacionária, junto a todas as outras consequências da pandemia em outros países e os efeitos da guerra na Ucrânia, contribuem para que economias (sobretudo as desenvolvidas) continuem a elevar suas taxas de juros, para tentar frear a alta de preços.
Queda na demanda
Sob a ótica da demanda também há problemas. As medidas de restrição fizeram cair a demanda interna chinesa, explica Simone. Com as empresas fechadas, cai a necessidade da aquisição de diversos produtos, principalmente as commodities.
Além disso, fábricas sem funcionar fazem aumentar o número de desempregados entre as faixas etárias mais jovens, segundo o Escritório Nacional de Estatísticas, o que também reduz a demanda – e, por consequência, reduz o crescimento da economia.
Para 2022, a expectativa do governo chinês é que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça 5,5%. Enquanto isso, as projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) apontam para um avanço bem menos expressivo, de 3,2%.
A queda na demanda interna chinesa também é um problema internacional porque se trata da segunda maior economia do mundo e um dos principais compradores de commodities. Se não há demanda, os países exportadores de commodities – caso do Brasil – perdem uma fonte de receita.
De acordo com Rodrigo Marcatti, economista e CEO da Veedha Investimentos, as restrições de circulação e o fechamento de atividades pelo país impactam não só a logística e a demanda, mas também os investimentos estrangeiros, porque a instabilidade deixa os empresários mais cautelosos.
Flexibilização deve acelerar a economia
“Com a retomada da economia no seu ambiente normal ,é esperada uma maior aceleração econômica, ainda mais em um país onde estímulos do governo são mais prováveis”, afirma Marcatti.
Uma aceleração na economia chinesa tende a estimular a atividade em outros países também, principalmente naqueles que são parceiros comerciais da China.
“(A China) é um dos principais parceiros comerciais do Brasil, principalmente em commodities. Então a flexibilização deve afetar positivamente a economia brasileira. A gente pode ver algum tipo de aumento da demanda, sim”, conclui o economista.
Com as primeiras notícias da flexibilização no país, as cotações de commodities como minério de ferro, petróleo e cobre já começaram a subir. Essa alta, embora contribua para um avanço nas ações de empresas exportadoras (como a Vale e a Petrobras), também pode gerar aumento nos preços de alguns produtos básicos do cotidiano, como os combustíveis.
A China demanda muito dessas commodities e, com a menor disponibilidade delas no mercado, os preços acabam subindo. E se o petróleo fica mais caro, sobe o preço dos combustíveis.
Em contrapartida, com a volta das atividades em empresas e fábricas chinesas, os problemas nas cadeias produtivas que impactam a oferta também tendem a se normalizar, explicam os especialistas, o que pode reduzir a pressão inflacionária global.