Estatal avalia reduzir de 100% para 15% o impacto do preço do petróleo e do dólar nos combustíveis
Os combustíveis estão em evidência no Brasil. Após o governo federal anunciar a reoneração da gasolina e do etanol, a próxima mudança significativa deve trazer uma redução na variação dos combustíveis. O governo Lula (PT) quer que a estatal abandone a Paridade de Preços de Importação (PPI), que leva em conta a cotação do petróleo e do dólar em 100% do cálculo.
A proposta que está em discussão prevê que 85% do cálculo seja feito com base nos custos de produção nacional e somente 15% estejam vinculados às cotações internacionais. Essa nova proporção atenuaria o impacto das flutuações do dólar e do petróleo no mercado internacional.
Em um ano marcado pela escalada de 43% do preço do petróleo e de ganho maior com a venda de combustíveis, a Petrobras registrou lucro recorde de R$ 188,328 bilhões em 2022. O resultado é 76,6% superior à marca anterior, de R$ 106,6 bilhões, em 2021.
Mas enquanto os números refletem o desempenho passado da petroleira, a diretoria da empresa já começa a discutir mudanças na sua política de preços. Este é o ponto central de uma série de mudanças que o governo pretende colocar em prática para conter o impacto de aumentos de gasolina e etanol nas bombas.
Reserva com Dividendo
O cálculo pode sofrer pequenas variações no caso do diesel e da gasolina já que o volume de importações é diferente. O debate sobre o novo modelo ainda não chegou ao âmbito do Conselho de Administração da estatal, o que só deve ocorrer após a assembleia geral de acionistas prevista para 27 de abril.
O tema é considerado de difícil solução dentro da própria empresa, uma vez que o que se busca é a adoção de uma regra dentro de parâmetros de mercado, mas que amorteça a turbulência em momentos de maior oscilação no mercado internacional.
A Petrobras anunciou previsão de pagamento de dividendos, de R$ 2,74 por ação, referentes ao quarto trimestre, o equivalente a R$ 35,8 bilhões. Com os números divulgados ontem, a Petrobras somará R$ 215,8 bilhões em lucros divididos referentes a 2022.
Mas em um sinal da direção que o governo pretende conferir à empresa este ano, a Petrobras informou que o Conselho de Administração da estatal, por sugestão da diretoria, vai propor que os acionistas avaliem a criação de uma reserva para reter até R$ 0,49 por ação com e sem direito a voto, referente ao balanço de 2022.
O montante ultrapassa o previsto na regra adotada pela petroleira para definir quanto vai compartilhar com os acionistas. Caso eles não aceitem a proposta, o valor seria repassado em 27 de dezembro deste ano.
No ano passado, a Petrobras foi a segunda maior pagadora de dividendos, de acordo com ranking global. E a farta divisão de lucros com os acionistas vinha sendo alvo de críticas do governo. Ao reter recursos, a empresa teria mais capital disponível para outros fins, como investimentos.
Venda de ativos suspensa
André Meirelles, diretor de alocação e distribuiçãoda InvestSmart, pondera, porém, que o pagamento de dividendos atraiu investidores nos últimos anos:
— Com mudanças na distribuição, a tendência é que investidores procurem outros papéis. Quando a empresa decide reter o lucro líquido para investir ou adotar qualquer política que possa impactar negativamente em sua receita a tendência é que haja um impacto negativo na distribuição de dividendos, o que não será necessariamente bem visto pelo mercado.
Em outra frente, o Ministério de Minas e Energia pediu à Petrobras que suspenda a venda de ativos por 90 dias. O objetivo é permitir uma reavaliação da Política Energética Nacional “atualmente em curso”, informou.
Uma das justificativas é a instauração de nova composição do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), “respeitadas as regras de governança da companhia, compromissos assumidos com entes governamentais e sem colocar em risco interesses intransponíveis da Petrobras”.
O texto diz ainda que o Conselho de Administração analisará processos em curso sob a ótica do direito civil e das regras de governança, assim como os eventuais compromissos já assumidos.
Na véspera, o governo havia anunciado que, para compensar a perda de arrecadação com a reoneração parcial de gasolina e etanol, o governo vai cobrar por quatro meses alíquota de 9,2% de imposto sobre exportações de petróleo bruto. A expectativa é levantar R$ 6,6 bilhões.
Ao longo do pregão, investidores repercutiram o pagamento do imposto sobre exportações, fator que pesou no comportamento de ações de petroleiras privadas e a suspensão da venda de ativos. Os papéis da Petrobras chegaram a cair mais de 2%, mas se recuperaram na reta final. As ações ordinárias (com voto) fecharam estáveis, a R$ 28,75, e as preferenciais (sem voto) subiram 0,24%, negociadas a R$ 25,30.
Para o analista de renda variável da Senso Investimentos, João Frota, o mercado já embute nos preços da empresa a possibilidade de interferência do governo. Mas no fim do dia influenciou mais o comportamento das ações a expectativa de resultado favorável no quarto trimestre, especialmente em relação ao pagamento de dividendos.
Ainda assim, avalia que a decisão do Ministério de Minas e Energia de congelar venda de ativos foi mal recebida.
— O planejamento da Petrobras previa foco no pré-sal e venda de ativos fora desse negócio central. Com a suspensão, a sinalização é que a Petrobras deve continuar com ativos pouco rentáveis para o seu porte — diz Frota.
Em relatório, analistas do Itaú BBA afirmaram que a preocupação com o futuro da política de preços da Petrobras se intensificou. Entre as justificativas, citam as recentes críticas à autonomia da empresa para fixar preços, o fato de o assunto ter se tornado tema frequente em reuniões políticas e de a reoneração parcial dos combustíveis ter sido anunciada no mesmo dia em que a estatal reduziu o preço da gasolina em R$ 0,13.