Em 12 meses, índice chega a 55,1%; no primeiro trimestre deste ano, alimentos subiram quase 20%
CNN – A inflação na Argentina chegou a 6,27% em março, o maior índice em duas décadas. A situação –resultado de anos de políticas populistas no país– tem levado ao empobrecimento da população. Por isso, os argentinos têm protestado e cobrado ação do presidente Alberto Fernández.
O argentino Miguel Díaz mora no bairro de Nueva Pompeya e costumava comprar de tudo no armazém na esquina de casa. Mas nos últimos tempos, ele aproveita o trabalho de motorista para procurar ofertas em diversos pontos da capital Buenos Aires. “Não dá para comprar em um só lugar, tem que ficar procurando o melhor preço”, diz.
E sempre que, no caminho, há alguma boa oferta, o jeito é descer do carro e comprar. Isso vale principalmente para alimentos, que ficam cada vez mais caros. “Não há salário que seja suficiente hoje em dia para comprar. Está muito difícil. Eu moro aqui com meu filho e é difícil. Não quero nem imaginar para quem tem três ou quatro filhos”, desabafa o argentino.
A angústia de Miguel é compartilhada por grande parte da população. Somente no mês de março, a inflação do país chegou a 6,7%, o maior índice mensal desde a crise de 2002, há 20 anos. Já a inflação dos últimos 12 meses chegou a 55,1%.
“Está difícil. Você não pode ficar sem trabalho. Do contrário, não tem comida”, conta o pedreiro Jose Luis Rodriguez.
E justamente os alimentos têm pesado no bolso dos argentinos. Somente nos primeiros três meses de 2022, os aumentos dos preços de alimentos e bebidas alcóolicas foram de quase 20%, 3,5 pontos a mais do que a inflação do geral trimestre. O fenômeno corrói a renda principalmente de setores mais vulneráveis, e deve impactar os índices de pobreza, que atingia 43,8% no final do ano passado, segundo o Observatório da Dívida Social da Argentina.
“A principal causa da inflação argentina tem a ver com desajustes fiscais. A Argentina sempre financiou isso, particularmente nos últimos tempos, com emissão monetária, gerando a semente da inflação”, afirma o economista Ariel Barraud, do Instituto Argentino de Análise Fiscal.
Barraud avalia que, além dos déficits fiscais crônicos e anos de políticas populistas, exacerbadas no governo do peronista Alberto Fernández, a pressão cambiária e a expectativa da própria população de que os preços irão aumentar agravam o problema.
“O que gerou a situação em que estamos agora foi o crescimento da participação do Estado em todos os níveis da economia. O setor privado se vê de alguma maneira afogado por restrições tributárias e por restrições de competitividade”, acrescenta o economista.
Apesar de os sucessivos governos argentinos tentarem a política populista de congelar os preços de alguns itens básicos na tentativa de conter a inflação, a estratégia, claramente, não tem funcionado para proteger o bolso do consumidor. Dados oficiais divulgados nesta quinta (21) mostram que, em março, os preços da cesta básica total, que inclui itens alimentares e não alimentares básicos para não estar na linha de pobreza, voltou a superar a inflação e aumentou 7%.
O presidente Alberto Fernández até tenta aliviar a situação com programas de transferência de renda, por exemplo. Mas a coligação de esquerda enfrenta um racha interno entre Fernández e a vice Cristina Kirchner. Ela foi contra o acordo de renegociação da dívida argentina com o Fundo Monetário Internacional (FMI) que prevê, por exemplo, a redução de subsídios elétricos.
O presidente da Federação de Donos de Armazéns da Província de Buenos Airespressiona o governo Fernández por soluções para lidar com a situação. “Os aumentos de preços chegam todos os dias para nós. Há pouco chegou a notificação para nós um aumento de uma empresa de pilhas, de entre 19% e 20%. Isso não é somente agressivo, mas nos deixa sem rentabilidade”, afirma Fernando Savore, presidente da federação.
Na outra ponta da crise, a população também pede soluções. Diversos protestos organizados por movimentos sociais tomaram as ruas de Buenos Aires nos últimos dias. O sentimento dos argentinos está resumido em uma faixa que diz: “produzimos, mas ainda somos cada vez mais pobres”.