Modelo está sendo debatido por grupo de trabalho na Câmara dos Deputados como parte do novo Código Processual Penal
Folha de São Paulo – Aprovado no pacote anticrime em 2019, a decisão sobre a implementação do juiz das garantias não deve ocorrer em 2022 devido à avaliação no Congresso de que o tema precisa ser melhor debatido e pela resistência de magistrados, que pressionam o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luiz Fux.
O juiz das garantias determina a divisão da responsabilidade de processos criminais em dois juízes: um autoriza diligências da investigação e o outro julga o réu.
Fux suspendeu a instituição do modelo em janeiro de 2020 devido a questionamento de entidades ligadas a juízes e ao Ministério Público. Ele é o relator dos processos.
O principal ponto questionado no texto aprovado no Congresso foi a falta de um vacatio legis —intervalo entre a publicação e a vigência de uma lei— compatível com a mudança proposta com a criação do juiz das garantias.
A lei passou a vigorar após 30 dias da publicação oficial, prazo considerado insuficiente pelo Judiciário. No entanto, mais de dois anos após a suspensão, Fux ainda não levou o caso para análise do colegiado.
Nos bastidores, o Supremo aguarda que seja aprovado o novo Código de Processo Penal, que ampliaria o prazo para as mudanças no Judiciário.
Com isso, as ações perderiam o objeto e não precisariam ser julgadas. Mas, no Congresso, a avaliação é a de que a discussão sobre o novo CPP só deve ser retomada em 2023, após as eleições, sob uma nova conjuntura de forças na Câmara e no Senado.
Entidades que representam magistrados também defendem que eventual mudança sobre a instalação do juiz das garantias fique sob responsabilidade do Congresso e volte a ser discutida apenas no ano que vem.
“Na prática, não tinha como o juiz das garantias ser adotado [no prazo anterior]. E agora, com a pandemia, com teto de gastos, com guerra, não há como cobrar um investimento em estrutura do Judiciário”, afirma Eduardo Brandão, presidente da Ajufe (Associação dos Juízes Federais).
A presidente da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), Renata Gil, afirma que o Congresso entendeu que foi muito curto o prazo proposto em 2019 e agora tenta corrigir o problema. Ela também afirma, porém, que o assunto só deve ser retomado no ano que vem.
A aprovação do juiz das garantias pelo Congresso foi cercada de controvérsia. O instituto era criticado pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, que argumentava que haveria acúmulo de trabalho para os magistrados.
Na época, o presidente do STF era o ministro Dias Toffoli, que defendia ser possível redistribuir os processos sem a necessidade de novas contratações e sem sobrecarregar juízes.
Defensores da proposta também diziam que o objetivo era dar mais imparcialidade aos julgamentos, na esteira da revelação de mensagens que sugerem a colaboração entre integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba e o então magistrado Moro.
Em oposição, o Tribunal de Justiça de São Paulo, o maior tribunal do Brasil, apontou que a instalação do novo modelo encareceria seus custos e seriam necessários ajustes orçamentários para que acontecesse.
No Supremo, tramitam quatro ações a respeito do tema, que apontam a possibilidade de inconstitucionalidade no texto aprovado pelo Congresso sobre o juiz das garantias.
Sob o argumento de que era necessário ampliar o debate, Fux convocou em outubro passado audiências públicas sobre o assunto. Depois disso, não houve andamentos relevantes nos processos.
Congressistas que encabeçaram a discussão do pacote anticrime reconhecem que o Congresso errou ao não estabelecer um prazo adequado para entrada em vigor da lei.
Para adequar a decisão, eles passaram a articular a ampliação do período para cinco anos a partir de 2019, quando o texto foi sancionado. A mudança seria feita no Código de Processo Penal.
Mas, na Câmara, a discussão do novo CPP tem esbarrado em entraves. Inicialmente, o texto estava sendo debatido dentro de uma comissão especial —colegiado da Câmara que analisa o mérito de uma proposta.
No entanto o relatório preliminar, a cargo do deputado João Campos (Republicanos-GO) e que incluía o juiz das garantias, foi alvo de muitas críticas. A comissão, então, foi encerrada no primeiro semestre de 2021 sem votar o parecer.
Em junho do ano passado, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criou um grupo de trabalho, colegiado mais flexível do que uma comissão especial. O relator seguiu sendo João Campos e a coordenação ficou a cargo da deputada Margarete Coelho (PP-PI).
No grupo, foi incluído o novo prazo para entrada em vigor do juiz das garantias.
Os cinco anos a partir de 2019 são um período considerado adequado pelos congressistas para que se estabeleçam as condições de adotar o juiz das garantias no país.
Ou seja, se o novo código fosse aprovado em 2022, por exemplo, haveria menos de três anos para que o instituto pudesse começar a ser aplicado.