Desde 1955, por tradição, chefe da delegação do Brasil é o primeiro a discursar. Presidente também criticou gestões anteriores e defendeu ‘cessar-fogo imediato’ na Ucrânia.
G1 – O presidente Jair Bolsonaro discursou nesta terça-feira (20) na abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York (EUA), e utilizou parte do pronunciamento para fazer um balanço das ações de seu governo, criticar gestões anteriores e citar políticas para mulheres e ações na pandemia.
Por tradição, o Brasil é o primeiro país a discursar na sessão de debates desde 1955 (veja detalhes abaixo). Antes de Bolsonaro, discursaram o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, e o presidente da assembleia, Csaba Korosi.
Bolsonaro é candidato à reeleição. Em um discurso de cerca de 20 minutos, citou ações como a criação do Auxílio Brasil, a redução de impostos que levaram à queda do preço dos combustíveis e privatizações de empresas estatais.
Em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás de Lula (PT), Bolsonaro disse que o governo acabou com a “corrupção sistêmica” que, para ele, existia no país, e citou as denúncias de corrupção envolvendo a Petrobras, reveladas pelas investigações da operação Lava Jato.
“No meu governo, extirpamos a corrupção sistêmica que existia no país. Somente entre o período de 2003 a 2015, onde a esquerda presidiu o Brasil, o endividamento da Petrobras por má-gestão, loteamento político e em desvios chegou à casa dos US$ 170 bilhões. O responsável por isso foi condenado em três instâncias por unanimidade. Delatores deveram US$ 1 bilhão de dólares e pagamos para a Bolsa americana outro bilhão por perdas de acionistas. Este é o Brasil do passado”, declarou Bolsonaro.
Esta é a quarta vez que Bolsonaro discursa na Assembleia Geral da ONU. Em 2020, o evento foi virtual em razão da pandemia, e o presidente enviou um vídeo gravado. Nas ocasiões anteriores, os discursos foram marcados pela defesa da soberania brasileira na Amazônia e por fake news sobre a Covid.
Guerra na Ucrânia
Ainda no discurso desta terça, Bolsonaro também defendeu que haja um “cessar-fogo imediato” na Ucrânia.
A guerra na Ucrânia começou em fevereiro deste ano, quando tropas militares russas invadiram o país. Várias cidades ucranianas foram bombardeadas, civis e militares morreram, e Bolsonaro jamais condenou a atitude do presidente russo Vladimir Putin.
“Diante do conflito em si, o Brasil tem se pautado pelos princípios do direito internacional e da Carta da ONU. Princípios que estão consagrados também na nossa Constituição. Defendemos um cessar-fogo imediato, a proteção de civis e não-combatentes, a preservação da infraestrutura crítica para assistência à população e a manutenção de todos os canais de diálogo entre as partes em conflito”, declarou Bolsonaro na ONU nesta terça.
O presidente, que disse defender uma solução “duradoura e sustentável”, declarou ainda avaliar que a solução para o “conflito” na região só será alcançada se houver diálogo entre os envolvidos.
“Faço um apelo às partes, bem como à toda a comunidade internacional, não deixem escapar nenhuma oportunidade para pôr fim ao conflito de garantir a paz. A estabilidade, a segurança e a prosperidade da humanidade correm sério risco se o conflito continuar”, completou.
Durante o discurso, Bolsonaro disse que o Brasil tem tentado “evitar o bloqueio dos canais de diálogo” entre os envolvidos no conflito no leste europeu causado pelo que chamou de “polarização” entre os atores. E acrescentou que o governo brasileiro é “contra o isolamento diplomático e econômico”.
“As consequências do conflito já se fazem sentir nos preços mundiais de alimentos, de combustíveis e de outros insumos. Estes impactos nos colocam a todos na contramão dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Países que se apresentavam como líderes da economia de baixo carbono agora passaram a usar fontes sujas de energia. Isso configura um grave retrocesso para o meio ambiente”, afirmou.
Ao todo, líderes mundiais de 193 países devem se reunir na Assembleia Geral, incluindo o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, autorizado pelo plenário a participar remotamente em razão da guerra na região.
Agenda internacional
Além de fazer o discurso de abertura, segundo o Ministério das Relações Exteriores, Bolsonaro deve se reunir com o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e com os presidentes da Polônia, Andrzej Duda, e do Equador, Guilhermo Lasso – ambos, de direita e conservadores.
Bolsonaro viajou de Londres para Nova York na tarde desta segunda (19) – o presidente e a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, estavam na capital do Reino Unido para o funeral da rainha Elizabeth II. A comitiva presidencial deve embarcar de volta para Brasília ainda nesta terça, ao fim das agendas oficiais.
O ministro das Relações Exteriores, Carlos Alberto França, deve permanecer em solo norte-americano e, segundo o Itamaraty, terá “encontros com homólogos de vários países e de eventos multilaterais de grupamentos dos quais o Brasil é parte”.
Ainda de acordo com o Itamaraty, a delegação brasileira participará de reuniões sobre “temas como desenvolvimento sustentável, educação, minorias étnicas, eliminação de armas nucleares, operações de paz, reforma do Conselho de Segurança, conflito na Ucrânia e mediação”.
O tema da 77ª Assembleia Geral da ONU é “Um momento divisor de águas: soluções transformadoras para desafios interligados”. A chamada “semana de alto nível” do evento – quando participam chefes de Estado, ministros e secretários – se estende até a próxima segunda (26).
Entrevista antes do discurso
Ao deixar o hotel em Nova York, Bolsonaro concedeu entrevista a jornalistas. Entre outros pontos, o candidato à reeleição defendeu ações do governo e repercutiu pesquisas eleitorais que o mostram em segundo lugar nas intenções de voto, atrás de Lula (PT).
“A população quer realmente a continuidade do nosso governo. Eu entendo que é no primeiro turno pra nós. As pesquisas não valem de nada. Erraram tudo em 2018. E agora obviamente potencializa o outro lado, que não pode sair às ruas nem para tomar um refrigerante no bar”, declarou Bolsonaro.
Brasil é primeiro a discursar
Desde a 10º Assembleia Geral das Nações Unidas, em 1955, o Brasil é o primeiro país a discursar no debate geral. Antes, em 1947, o diplomata brasileiro Osvaldo Aranha já tinha sido o primeiro orador na 2ª Assembleia Geral, que foi presidida por ele.
A tradição só não foi seguida em 1983 e 1984, quando o então presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, foi o primeiro a usar o microfone.
Em geral, os EUA falam em seguida ao Brasil, na posição de “país-sede” da Assembleia-Geral da ONU. A ordem dos demais países segue outros critérios, incluindo o nível hierárquico de quem fará o discurso (chefe de Estado, ministro ou embaixador).
Antes de Bolsonaro, devem usar o microfone nesta terça dois representantes da própria ONU: o secretário-geral da organização, António Guterres; e o presidente da 77ª Assembleia, o diplomata húngaro Csaba Kőrösi.
Anos anteriores
Em 2019, no primeiro ano de governo, Bolsonaro usou a tribuna da Assembleia Geral para defender a soberania brasileira sobre a Amazônia e dizer que o país não faria novas demarcações de terras para indígenas.
Naquele momento, ainda antes da pandemia, o Brasil figurava no noticiário internacional graças ao aumento do desmatamento e das queimadas e ao desmonte progressivo da legislação ambiental.
Em 2020, primeiro ano da pandemia, Bolsonaro participou do evento a distância e disse que o Brasil era “vítima” de uma campanha “brutal” de desinformação sobre a Amazônia e o Pantanal.
O presidente também disse que a imprensa no Brasil tinha “politizado” o vírus e que as medidas de isolamento – que foram autorizadas pelo Supremo Tribunal Federal e adotadas por governos locais, à revelia do governo federal – “quase” levaram o país ao “caos social’.
Já em 2021, último discurso até aqui, Bolsonaro distorceu dados sobre o meio ambiente e a economia brasileira e defendeu, no plenário da ONU, o uso de medicamentos sabidamente ineficazes contra a Covid em protocolos de “tratamento precoce”.
Bolsonaro também se posicionou contra restrições adotadas à época, por diversos países, contra pessoas que se recusavam a tomar a vacina.