Protegido pela coalizão religiosa e de extrema direita, premiê ignora protestos e avança com a reforma judicial que impede a sua destituição.
G1 – Para quem tinha alguma dúvida de que Israel caminha para um regime autoritário, Benjamin Netanyahu foi bastante assertivo no discurso que fez à nação, após ser blindado pelo Parlamento dominado por sua coalizão de extrema direita: “Até hoje minhas mãos estavam atadas. Basta! A partir de agora, estarei envolvido e farei tudo ao meu alcance para chegar a uma solução, pelo bem de nosso povo e do nosso país.”
Traduzindo: antes da votação desta quinta-feira, ele estava sob a mira da procuradora-geral, Gali Baharav-Miara, e poderia ser considerado inapto para o cargo e destituído por conflito de interesses, já que é julgado por três diferentes processos na Justiça. Respaldado pelo Parlamento, Netanyahu agora se considera protegido pela aliança fundamentalista de religiosos e nacionalistas que construiu para dar aval à sua reforma judicial.
Sua solução, portanto, é seguir em frente. O primeiro-ministro ignora os protestos gigantescos que se alastram há 11 semanas pelo país e abrangem representantes de setores mais diversos da sociedade israelense, como juízes, militares reservistas e funcionários de empresas de tecnologia. Deixou claro que a reforma, que enfraquece o sistema judiciário em Israel, avança e deverá ser concluída antes do início da Páscoa judaica, no próximo dia 5.
O que vem a seguir é a concretização de uma crise constitucional, em que os poderes do Estado estão em conflito, algo sem precedentes nos 75 anos de Israel.
Nesta sexta-feira, a procuradora-geral Baharav-Miara escreveu a Netanyahu assegurando o caráter ilegal na atuação do premiê. “Qualquer ação tomada por você é ilegal e manchada por um conflito de interesses”, tachou a procuradora, referindo-se ao envolvimento pessoal do premiê para reformar o sistema judicial enquanto é julgado por corrupção.
Reeleito há menos de três meses, Netanyahu não recua e parece não se intimidar com a ferrenha oposição ao seu projeto de esvaziar o poder dos tribunais. Na ausência de uma Constituição formal em Israel, cabe à Suprema Corte a análise das 12 Leis Básicas que regem o país.
A reforma do governo encarrega o partido que está no poder da nomeação de juízes e permite ao Parlamento anular decisões da Suprema Corte por uma maioria simples de 61 votos. Desta forma, deixará para o Legislativo controlado por radicais religiosos e de direita a decisão final sobre leis que prejudicam direitos da minoria árabe, da imprensa e da comunidade LGBTQIA+.
Sem exageros, o projeto de Netanyahu é qualificado por opositores como um golpe: o governo rompe as barreiras que asseguram estado de direito e se alinha a outros regimes que atendem à nomenclatura de ditaduras.