Técnicos do governo foram convocados às pressas para discutir medidas tributárias para combustíveis
F SAO PAULO – A intenção de taxar os lucros extraordinários da Petrobras, na esteira da alta nos preços do petróleo e de combustíveis, deve vir acompanhada de uma autorização para que as despesas financiadas com essas receitas fiquem fora do teto de gastos —regra fiscal que limita o avanço das despesas à inflação.
A medida deve ser um dos pontos de discussão na reunião de líderes convocada para a próxima segunda-feira (20) pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
A combinação das iniciativas também está no radar de integrantes do Senado, onde já tramita uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que busca destravar um repasse de R$ 29,6 bilhões fora do teto de gastos para subsidiar a redução de tributos estaduais sobre diesel, gás e etanol.
Segundo integrantes do Congresso e lideranças políticas, a PEC em tramitação pode ser modificada para incluir mais essa autorização. Um parlamentar afirma reservadamente que “há muita pressão nesse sentido.”
A política exata que seria bancada com esses recursos, porém, ainda está em discussão. São citados nos bastidores um auxílio para caminhoneiros, taxistas e motoristas de aplicativo, além de um possível aumento no Auxílio Gás, criado no ano passado para subsidiar a compra de botijão por famílias de baixa renda.
Na área econômica, há temor com o tamanho da fatura que pode ser gerada a partir das novas articulações.
Lideranças na Câmara querem debater ainda a ideia de taxar as exportações de petróleo. Os recursos arrecadados com o tributo, que hoje não é cobrado, seriam usados como subsídios para reduzir o preço do diesel, segundo um dos autores da proposta, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE).
Os temas também devem ser levados ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que defendeu na sexta-feira (17) o uso do lucro da Petrobras para abastecer uma conta de estabilização de preços de combustíveis.
A forte alta no preço do diesel e da gasolina é apontada como um grande obstáculo à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) e também preocupa seus aliados no Congresso, muitos dos quais buscarão a renovação do mandato no pleito deste ano. Isso explica a determinação dos parlamentares em exibir alguma reação.
Os instantes que sucederam o anúncio oficial do novo reajuste em preços de combustíveis pela Petrobras foram de intensa movimentação nos gabinetes do governo em Brasília, apesar do ponto facultativo em decorrência do feriado de Corpus Christi na quinta (16).
Técnicos foram convocados de última hora para trabalhar em possíveis medidas para conter o impacto dos reajustes.
Uma das frentes envolve justamente a taxação dos lucros extraordinários da Petrobras, defendida publicamente nesta sexta por Lira. O presidente da Câmara chegou a falar em dobrar a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). A Petrobras paga hoje a alíquota geral do tributo, que é de 9%.
A Receita Federal já está em prontidão para analisar a viabilidade da medida e estimar quanto seria arrecadado com eventual elevação da alíquota.
Segundo fontes ouvidas pela Folha, a medida considerada mais viável é a elevação da CSLL para empresas do setor de óleo e gás em geral, uma vez que não seria possível particularizar a cobrança extra sobre apenas uma empresa. Modelo semelhante é adotado para bancos e instituições financeiras, setor que paga uma alíquota maior de CSLL.
Também seria “inédita” a previsão de uma tributação maior a partir de determinado gatilho de preços de petróleo ou nível de lucro das petrolíferas. Por isso, técnicos avaliam como mais provável uma elevação simples da alíquota da CSLL para o setor.
No primeiro trimestre deste ano, a Petrobras registrou um lucro de R$ 44,5 bilhões, após um resultado recorde de R$ 106,6 bilhões em 2021. Sem uma tributação extra, como vem sendo adotado em outros países, a companhia ampliou a distribuição de dividendos a seus acionistas —incluindo a União.
Bolsonaro já disse que o lucro da companhia é “um estupro” e que novos reajustes poderiam quebrar o país.
Uma das ponderações sobre a taxação do lucro extraordinário é que as novas receitas começariam a cair nos cofres federais apenas no fim do ano, já que a elevação de um tributo como a CSLL requer antecedência de 90 dias (a chamada “noventena”), como mostrou o Painel.
Nesse sentido, o imposto sobre exportações teria a vantagem de poder ser elevado de forma imediata, por ser considerado um tributo regulatório.
Em outra frente, técnicos da equipe econômica também trabalham para acelerar o trâmite de sanção do projeto de lei complementar que fixa um teto para as alíquotas de ICMS —imposto estadual— sobre combustíveis, energia, transporte e telecomunicações.
O texto também inclui o corte de tributos federais sobre a gasolina e o etanol até o fim deste ano. As alíquotas sobre diesel e gás já estão zeradas desde março.
A votação do projeto foi concluída na quarta-feira (15), e os técnicos trabalham para que a lei seja publicada até a próxima segunda. Embora o corte de tributos leve algum tempo até chegar nas bombas, a avaliação é que a medida pode neutralizar parte dos aumentos anunciados pela Petrobras.
A estimativa apresentada pelo senador Fernando Bezerra (MDB-PE), relator do projeto de lei sobre o ICMS e da PEC dos Combustíveis, era de que as duas medidas em conjunto resultassem em redução de R$ 0,76 no litro do diesel e R$ 1,65 na gasolina.
Bolsonaro, por sua vez, chegou a citar cálculos de alívio ainda maior: R$ 1 no diesel e R$ 2 na gasolina. Nesta sexta, a Petrobras anunciou uma alta de R$ 0,20 no litro da gasolina e de R$ 0,70 no diesel.